A falência do chamado socialismo real pode ser comprovada amplamente, ao gosto do freguês: por farta literatura, cinema e as próprias ciências sociais. Na União Soviética e na Cortina de Ferro, essa derrocada passou na TV ao vivo, no mundo inteiro, com a queda do muro, o fuzilamento do casal Ceausescu na Romênia, a desintegração da Iugoslávia e o papa João Paulo II cantando de galo pra comemorar uma vitória quase pessoal. De minha parte, assisti à ruína do socialismo real em Cuba, nos três meses em que morei lá, em 1989, embora Cuba tenha muito que ensinar ao mundo e que, em alguns campos importantes da vida, exiba dados impressionantes. Mas no geral a conta fecha negativa, pelo nível de pobreza apresentado pela quase totalidade da população. Socialismo pra isso não serve, e foi isso que fez seu modelo ruir, ensejando, de quebra, o conceito de socialismo real, como se restasse a esperança de um socialismo utópico perfeito.
Continuo com a visão crítica para a vida e o mundo, mas carrego comigo a impressão de que a ideia de socialismo verdadeiro, aquele que faz jus ao nome e à justiça social em si, só funciona na morte. A morte é demonizada desde que largamos o berço e tomamos conhecimento dela, e não é pra menos, afinal, à exceção dos suicidas, ninguém quer largar o osso e a festa que é só o fato de estar por aqui, mesmo em condições desumanas. Bom ou ruim, antes vivo do que morto, não é assim? Mas era na morte que se materializava a única justiça imparcial, cega, certa e segura. Desde remotas eras, reis, príncipes e faraós tentaram driblá-la, ou disfarçar sua sentença inadiável, sem sucesso.
Aqui nas redes leio texto distribuído pelo amigo espanhol Fernando Roqueta, do autor Ramón Barea, que relaciona as principais vítimas das grandes pestes contemporâneas. A Aids, no começo dos anos 80, que matava viados, putas e drogados. A epidemia de Ebola, em 2016, que atingia negros e os que se metessem por esses países exóticos, ou a grande crise de 2008, que era, afinal, uma calamidade contra os pobres. Assim, agora estamos diante de uma ameaça que foi para o coração da vida ocidental e desequilibrou toda a segurança que os donos do mundo ostentavam até então. Diz ainda o autor que, enquanto o problema estava circunscrito à China, todos eram risos e piadas, na suposta certeza de que esses males de tão longe jamais afetariam nosso confortável e seguro modo de vida ocidental. Eis que estávamos todos enganados, minimizando esse monstro que agora nos morde os calcanhares sob nossos lençóis. O medo é de todos, sem distinção, porque é real. Não foram as duas grandes guerras e outras tantas, nem os cracks de bolsas, invasões, saques e genocídios que fizeram o homem pensar duas vezes. Foi uma ameaça real que não dá segurança absolutamente a ninguém e, por isso mesmo, a mais justa de todas, como a morte.
É a partir destas cinzas que retomaremos um mundo novo. Ou não.
2 comentários:
Luciano,
Bom demais ler seus textos! Não dá vontade de acabar!
Beijo
sonia.
Obrigado, Sônia. Idem em relação ao seu blog Um Lugar no Mundo, o melhor blog de turismo do mundo
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