quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Especial TV Alese sobre José Carlos Teixeira

Especial sobre o ex-prefeito de Aracaju, ex-deputado e ex-vice-governador José Carlos Teixeira na TV Alese


https://www.youtube.com/watch?v=p7TuSHvgLKU

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

Entrevista com Tom Zé

Em 2003, fiz essa entrevista com o cantor/compositor Tom Zé para a Rádio UFS On Line (ainda um projeto da atual emissora, só na net), por telefone. Tom Zé se preparava para uma apresentação em Aracaju, por ocasião dos 35 anos da UFS. A entrevista também foi publicada no jornal Cinform.


Luciano – Tom, como está a saúde?

Tom Zé – (Solta uma longa risada). Contente de ouvir esta voz nordestina... Ah, (a saúde) tá ótima. O coração ficou perfeito.

Luciano – Tom, aqui é o Luciano Correia, da Rádio UFS On Line, de Aracaju. Você inclusive vai estar aqui nos dias 9 e 10 de dezembro...

Tom – Por isso a alegria é dupla: finalmente eu vou a Aracaju.

Luciano – Uma coisa curiosa: você primeiro encantou lá fora, depois de ter passado cerca de 20 anos praticamente no ostracismo, por fazer uma música considerada difícil. Como é que você encara esta extraordinária que seu trabalho alcançou aqui, somente depois de reconhecido lá fora?

Tom – Tem um episódio que explica um pouco o que você tá perguntando e que aconteceu aí vizinho de vocês no Recife, no “Abril Pro Rock” de 1998, uma coisa curiosa. Eu ainda era considerado um compositor “de elite”, meio difícil e tal... Foi no encerramento... Eu, um artista de elite, vou cantar, entro no palco. Não deu tempo tirar as 8.500 pessoas que estavam lá para botar 8.500 intelectuais, não sei nem se tinha isso no Recife. O fato é que eu cantei pra o mesmo público de todo mundo. E aí, na hora em que eu fiz um sucesso danado  e que o público não queria que eu saísse do palco e que não deixava outra banda subir e o diabo, como a imprensa toda do Brasil estava presente lá, nessa noite acabou-se o mito do artista difícil e nasceu um cantor popular que tá agora falando aqui na Rádio UFS de Sergipe e de Aracaju para o Luciano, graças a Deus.

Luciano – Mas você ainda não realizou um sonho, que é cantar nas rodoviárias e nos cabarés... (ele interrompe com uma gargalhada, surpreso com a citação aos cabarés, presente em algumas das matérias e releases que divulgam sua obra na internet)

Tom – Tá bom, tá bom, nos cabarés eu não tinha botado, não, mas é uma ótima idéia. Quando eu era pequeno frequentava cabarés em Irará e – ave Maria! – tocar lá seria uma glória.

Luciano – Aliás, como foi essa história de só ter conhecido uma lâmpada aos 13 anos de idade?

Tom – Bom, querido, aí em Aracaju naturalmente são capital e são muito mais jovens que eu. Eu nasci em 1936 e nessa época Irará era a Idade Média, cidade muito pequena do interior da Bahia. Eram 13 mil almas vivendo ali, sem nenhum automóvel, nenhum motor, nenhum caminhão, nenhum barulho que fosse da civilização. Então todas as relações, de trabalho, familiares, aquilo era uma Idade Média em todos os sentidos. E um belo dia uma família rica de Feira de Santana construiu três casas em Irará, antes de chegar a energia elétrica, em 1950. Isso foi em 47, 48. E então eles puseram luz elétrica e um dia, na casa do farmacêutico, minha mãe e eu íamos descendo para casa e a mulher do farmacêutico chamou a gente e nos sentou naquela varanda. E acendeu uma lâmpada pra gente ver a luz elétrica: nossa senhora! Realmente, uma lâmpada daquela, límpida, absolutamente clara, sem nada que manchasse a clareza da luz quem parecia que vinha do próprio Paraíso. Parece que naquela hora morreram a mula sem cabeça, o lobisomem, a caipora, todos os monstros de assombração da minha infância, porque naquele tempo a noite era o sítio do medo, era a hora de ter medo para as crianças.

Luciano – E isso não te provocou também um desencanto?

Tom – Cada elemento da civilização, o cinema, a torneira... A torneira ainda é uma coisa mais fantástica. Você é acostumado a pegar água a três, quatro quilômetros da cidade e o pessoal com jegues ia lá com quatro barris e traziam pra minha casa, que era uma casa grande, botava numa talha  e então tínhamos água para beber a semana toda. Por que a água pra tomar banho e lavar roupa era de uma cisterna cavada no fundo da casa. Então um belo dia eu fui numa casa em Salvador e aí minha tia disse: “lave o rosto ali”. Eu olhei pra aquela pia vazia e pensei “como é que vou lavar o rosto ali?” Ela mandou abrir a torneira e eu vi aquele negócio com aquele biquinho lá em cima, mas não podia imaginar que aquilo é o que se chama de torneira. Quando ela abriu que aquilo saiu água de dentro, era como se a fonte da nação tivesse andado até dentro de minha casa... um verdadeiro milagre. E na hora que eu acabei ela disse: “Feche, feche a torneira”. Aí eu já me arrisquei e fechei totalmente e vi que a fonte desapareceu. Que coisa mais mágica! Coisa de conto de fadas. Assim foi tudo da civilização na minha vida, tudo, o mar, as ruas, o calçamento das ruas... o próprio alfabeto. Nossa senhora!, o alfabeto pra entrar na minha vida foi uma coisa fantástica. Aliás, aí perto de vocês, em Sergipe... ou Alagoas, tem um dos melhores escritores do Brasil que é  o ... (demora a lembrar o nome)

Luciano – Graciliano Ramos...

Tom – O Graciliano, que fala também da infância dele de maneira maravilhosa. Ele é de Aracaju ou de...

Luciano – Não, ele é Quebrangulo, na época povoado pertencente a Palmeira dos Índios, Alagoas, onde foi prefeito...

Tom –  É, isso mesmo. O contato dele com o alfabeto também foi uma coisa fantástica... Eu estou contando isso para os jovens procurarem ler o livro dele sobre isso, que é uma maravilha. Agora, eu também estou lançando um livro, o “Tropicalista Lenta Luta”, que fala de como eu, na infância, me metendo a fazer música, me deparei com uma realidade trágica: o fato de eu não ser bom compositor, como não sou até hoje; não ser bom cantor, como não sou até hoje; e não ser bom instrumentista, como não sou até hoje. Foram dessas deficiências que eu construí o caminho que tá me permitindo falar agora na Rádio UFS...

Luciano – Agora, você encontrou um Rio ou São Paulo supostamente modernizado, já com a torneira e a luz há muito tempo. Mas musicalmente esse “Sul maravilha” vivia na Idade Média também... (ele corta e diz que não). Mas o tropicalismo não é também um rompimento com essa Idade Média, não é a luz que acende...

Tom – É, você pode considerar isso, porque aqui estava chegando a terceira revolução industrial, tava chegando a automação do computador e dessa multiplicação da força humana já diferente da multiplicação que as máquinas permitiam, que foram as 1as e 2as revoluções industriais. Mas na terceira revolução realmente o computador ainda estava chegando aqui. Em 1968, para caber os computadores que existiam em São Paulo era preciso fazer uma sala enorme para entrar aquele monstro...

Luciano – Era o “cérebro eletrônico”...

Luciano – Sim, isso, o cérebro eletrônico. Mas o Tropicalismo realmente colaborou para criar uma disposição, uma aceitação do mundo novo, isto criou. Mas no que se referia à minha saída da Idade Média pra música que fiz até 1960, era realmente um rompimento de espaços transoceânicos, no sentido de trans-seculares, de espaços trans-seculares. Mas a partir de Salvador, em 1949, quando eu fui estudar lá, era uma cidade de 400 mil habitantes. Hoje você sabe que tem 2  ou 3 milhões...

Luciano – Três milhões, é a terceira cidade brasileira hoje...

Tom – Você vê que loucura... Então era uma cidade provinciana. Quando passava um automóvel na rua você dizia “lá vai o doutor Fulano”. Os automóveis eram conhecidos pelos donos. Hoje nem cidade do interior mais goza dessa coisa bucólica.

Luciano – Você diz que não se considera bom compositor nem cantor até hoje ... (ele corta)

Tom – Ora, (com ênfase) eu não sou! Eu não me considero: eu não sou! Eu construí um caminho e um sucesso, principalmente no exterior, fora da estrada que era palmilhada pela boa música, pela boa voz, pelo bom instrumentista.

Luciano – Você tem uma voz belíssima, Tom.

Tom – Bom, hoje em dia já pode admitir, é claro, que eu aprendi um pouco a cantar, mas quando eu era jovem, pode perguntar às pessoas mais velhas da cidade (Irará) que anos 40 cantar não era o que  eu faço...  Cantar era uma coisa expressionista que necessitava de toda potência da voz, porque precisava ter potência de voz, e fazer aquela coisa superdramática e tal... Cantar não era o que é hoje.

Luciano – Mas eu ouvi hoje um dos seus primeiros discos e achei uma coisa linda, afinadíssima...

Tom – Hoje em dia, no universo que vivemos, esse tipo de coisa que eu faço pode ser chamada de cantar. Mas como eu tenho 67 anos e comecei a tentar fazer isso em 1950, naquele tempo o que eu faço hoje não era cantar. O verbo cantar não era pra essa atitude. Era a chamada voz de taquara rachada.

Luciano – E então a que você atribui sua explosão no mundo. O disco “The Best of Tom Zé” é considerado um dos 10 melhores do mundo, numa relação onde, em 150, nenhum outro brasileiro é citado...

Tom – É curioso isso. Eu passei por um ostracismo, por uma fase de completo esquecimento de1973 a 1990, quando este disco que você tem na mão foi lançado. Ele foi feito em 1990 e lançado pelo David Bowie nos Estados Unidos, mas os discos que contêm nele, dessa compilação, foram feitos em 1973 , chamava-se “Tom Zé Todos os olhos”, aquele que tem o ânus na capa (sic) e o outro chamou-se “Estudando o samba”, de 1976. Imagine que no Brasil, em 73 e 76 se fizeram dois discos que em 90 foram lançados juntos nos Estados Unidos. Esses dois discos juntos, feitos no Brasil na década de 70, na década de 90 foram escolhidos como um dos melhores 15 discos do mundo. Nossa Senhora, como esse Brasil faz música boa...

Luciano – Pois é, e nós temos Tom Jobim, temos tantos artistas que fazem sucesso lá fora e você tá muito à frente... (corta)

Tom – Não, eu não tou à frente. No caso de Jobim ele é realmente “um rei da bola”. Agora no exterior minha música circula com grande divulgação, com tapete vermelho e tal.

Luciano – Agora, a alegria de ser redescoberto no exterior não causou também uma certa tristeza por ter sido lá fora e não aqui?

Tom – Não, não. Quando você acha um colo materno, uma mãe para lhe acolher, isso pode ser do outro lado do mundo, no Japão, na China, na Cochinchina, em qualquer lugar você tá acolhido por uma mãe. Claro que quando eu voltei a poder  tocar no Brasil, a circular aqui, isso me deu uma alegria renovada. Mas na hora que você  está abandonado, que você está exposto, como se fala na Bíblia, isso vale como se fosse eternamente uma bênção.
 
Luciano – E agora a mãe Brasil tá lhe acolhendo muito bem, né?

Tom – Sem dúvida, o que é uma grande alegria, porque, afinal de contas, eu faço minha música para o Brasil. Todos os elementos da minha música são brasileiros, eu sou (com ênfase) sambista! Eu faço samba! Claro que é um samba bastante estranho, mas é samba. O curioso é isso: eu não faço rock, nem iê-iê-iê, nem diabo nem porra nenhuma. Eu faço samba e baião e tá acabado. E outra coisa: as pessoas que amam minha música no exterior amam uma música cantada em português, português da Bahia. Porque o pessoal pode pensar que a música vai pra lá traduzida. Não. Vai uma tradução na contracapa do disco, mas as músicas são em português. Eles amam a língua portuguesa através da gente.

Luciano – Em “Defeito de fabricação” (Cd lançado em 1998) você diz “A burrice está na mesa”. Isso tem a ver um pouco com esse Brasil de hoje? Você acha que há uma burrice até sendo majoritária em relação à inteligência que poderia trazer as soluções para os nossos problemas?

Tom – O Brasil é um país que tem  vocação para a pesquisa, para a descoberta, mas é muito pouco o dinheiro que as universidades recebem para a pesquisa séria. Entretanto, de vez em quando aparece um mulatinho aí no “Jornal Nacional” com o nome de Ferreira da Silva, José dos Santos, Maria das Dores, que acabaram de descobrir uma colaboração para a pesquisa que o mundo tá fazendo agora no genoma humano ou na engenharia genética. Então o Brasil tem vocação pra pesquisa. Mas existe uma intenção de lobotizar a população brasileira e isso agora é  mais obra da força do dinheiro internacional. Porque para se erradicar o analfabetismo aí no nosso Nordeste é muito difícil, porque o dinheiro que às vezes o próprio governo manda fica nas mãos dos coronéis. Então nós estamos acostumados com esses vícios. Enquanto os grandes interesses capitalistas ou empresas internacionais querem populações miseráveis, que não saibam nada, pra poder ter emprego miserável e ganhar uma miséria, nós também lutamos: nossa música, nossas emissoras de rádio, nossa imprensa... Muitas vezes até nossos governos lutam na direção contrária.

Luciano – E por falar na ascensão dos Silvas, esse Inácio da Silva que chegou no Palácio do Planalto, como é que você  está vendo o governo dele?

Tom – Eu costumo dizer que agora não sou mais pedra, sou governo. Porque eles acham que, como eu critico muito, sou um eterno anti-PT. Mentira, na verdade eu critico quando vejo que tem coisa que pode melhorar. Mas toda vida eu sou pelo lado mais ético, mais civilizado, mais responsável da política nacional, que naturalmente é o PT. Então agora eu não posso nem criticar mais. Quando o PT não era governo eu podia criticar até o próprio PT. Agora não.

Luciano – O período que você passou no ostracismo, passou dificuldades, não foi?

Tom – Ah, sim, claro. Não passei fome, mas dificuldades muitas. Minha mulher trabalhava como secretária e acabava que, na divisão (do sustento) da casa, ela tinha de entrar com mais dinheiro do que eu. Mas aqui em São Paulo tem uma coisa gozada: a classe universitária é muito numerosa, aqui e no interior. E como eu era artista deles, os diretórios acadêmicos ligavam e eu ia lá cantar. E eu tinha um remediado dinheirozinho que  ia mantendo as coisas, até que em 1999 eu desisti disso. Nas vésperas do David Byrne me procurar eu ia pra Irará tomar conta do posto de gasolina do meu sobrinho, porque quando eu era pequeno meu pai tinha loja. Eu queria um trabalho desse gênero, não queria ficar aqui trabalhando em nada, porque não sou paulista nem do sul...

Luciano – Então, eu ia te perguntar isso: é séria essa história de que você pensou em tomar conta do posto do seu sobrinho em Irará? Ia ser frentista?

Tom -  É isso, trabalhar num posto de gasolina. Esta semana a televisão da Bahia, a ...

Luciano – A TV Educativa?

Tom – A  Educativa foi lá em Irará e eu botei gasolina em dois ou três carros e baixei o preço da gasolina, fiz uma promoção lá (dá uma gargalhada). No posto onde eu iria trabalhar, no posto do Dequinha, na entrada de Irará. O pessoal de Aracaju conhece Irará... (Muda de assunto e lembra a infância no interior da Bahia). Escuta, tinha uma praia, eu acho que já era do lado de Sergipe, chamada Jorro... (se  refere ao município de Caldas do Jorro, no sertão baiano, a cerca de 400 km de Aracaju). Essa praia ainda é famosa? Meus pais foram uma vez, mas eu nunca fui...

Luciano – Não. Jorro é um balneário, Caldas do Jorro, perto de Caldas de Cipó. É distante do litoral, fica distante de Aracaju, mas é razoavelmente perto da fronteira de Sergipe com a Bahia...

Tom – Ah, então procure saber direito, pra quando eu for aí vocês me contarem, porque meus pais foram pelo menos uma vez e na minha infância eu lembro que era um lugar de sonho. Eu sonhava muito de ilha e tal. E eu nunca fui, porque a seca de Irará não deixava eu juntar dinheiro.

Luciano – Você já foi do Partido Comunista, não foi?

Tom – Metade de minha família era reacionária, metade era do Partido  Comunista. E eu tava sempre ali perto do partido, embora frequentei quando estava em Irará, em 1960, porque os caras do partido lá eram um puta barato. Bicho, o delegado de Irará era comunista: Raul Cruz, a gente chamava ele “O xerife”. O dono do jogo do bicho, João Pechincha, era comunista. Tertuliano Teixeira, um cara maravilhoso, que tinha uma fabricazinha de vinho de jurubeba. Eram companhias adoráveis, as mais finas de Irará. Eu ia nas reuniões do partido toda semana. No interior do Brasil tem essas idiossincrasias: às vezes o padre é que é comunista. Não eram intelectuais, mas eram pessoas vivas, sábias e eu gostava muito deles. Mas em Salvador nunca fui ao partido. Quando trabalhei no CPC (o Centro Popular de Cultura da UNE, nos anos 60) eu era considerado como se fosse do partido. Não tinha nada contra isso, porque ninguém me cobrava adesão 100 por cento nem me incomodava ser teoricamente do partido, do “Partidão”, né? Eu tinha muitos amigos no PC do B.. Porque eu nunca fiz distinção, nunca me interessou essas brigas bodas. Qualquer coisa que fosse de esquerda era digna da minha atenção.

Luciano – Você já cantou  em Irará?

Tom – Em Irará eu cantei em 1968, quando ganhei o Festival da Record me levaram para cantar num cinema. Foi um show horroroso, uma esculhambação. Depois, um dia, alguns comerciantes de lá pagaram uma cota e me levaram pra cantar num lugar aberto. Também foi muito difícil, eles não podiam levar a banda e eu tive que cantar sozinho. (Diz, enfático) Em Irará eu não sou um artista, em Irará sou um fracasso!

Luciano – Você não tem vontade de refazer essa história, consertar essas coisas?

Tom – Ah, se tivesse dinheiro eu levava uma banda, mandava montar um palco com o melhor som do mundo e fazia um puta show de arrasar em Irará, desses que eu faço na Europa. (risos)

Luciano – E o último disco, “Imprensa cantada”...

Tom – Eu vou vender aí tanto o disco, quanto o livro, quanto o DVD, a preços muito mais baratos.

Luciano – Seu livro seria um contraponto ao “Verdade tropical” de Caetano Veloso?

Tom – Talvez possa ser. Hoje mesmo li uma crítica de um jornalista da “Folha de S. Paulo”, aconselhando a comprar o livro, ele dizendo que o Caetano escreveu como o autor de um ensaio e que eu escrevi simplesmente como um artista... (ele interrompe: “rapaz, tá armando uma chuva aqui formidável, aqui em São Paulo tá precisando de chuva). Enfim, escrevo de uma maneira bem mais simples... (ele dispersa o raciocínio) ... outro dia me ligaram de Itabaiana pra saber se eu ia aí (Luciano interrompe e diz que é a cidade dele). Pois então, avise ao pessoal de Itabaiana que eu vou mesmo. Vão amigos de Recife me encontrar aí e de Alagoas... de Arapiraca também.

Luciano – O meu pai, que mora em Itabaiana e tem 77 anos, vem para o show, sabia?

Tom – (solta uma longa gargalhada). Diga a ele que vou cantar uma música pra ele, uma música bem antiga...

Luciano – O nome dele é João Correia.

Tom – Diga a ele que sem João não tem show em Aracaju.

Luciano – Obrigado, Tom, foi um prazer.

Tom – O prazer é meu. Eu tava sonhando para ir a Aracaju.Viva Aracaju e não se morre mais, na Rádio UFS...

Luciano – Viva Zé, o nome do Tom.




   


sábado, 31 de janeiro de 2015

Discurso de despedida da presidência da Fundação Aperipê de Sergipe, em 28 de janeiro de 2015

Meus parceiros da querida Fundação Aperipê,

Primeiramente quero dizer que o sentimento que me move agora, ao deixar a presidência da Fundação Aperipê, é de alegria, nunca de tristeza. Alegria, porque, lá atrás, ao tomar posse, marcamos no ski line do infinito algumas metas a serem encampadas. E hoje, três anos e meio depois, eu digo com segurança: se não cumprimos todas, mas avançamos muito, sobretudo nas questões fundamentais, como a digitalização, a qualificação da programação dos três veículos da casa, a implantação, pela primeira vez na sua história, da racionalização administrativa, financeira... A adoção do planejamento estratégico, outra figura desconhecida na casa e da consolidação de um padrão Aperipê próprio para as programações das rádios e da TV. Foi graças a este padrão que inserimos nossa FM no círculo da Arpub, a associação das rádios públicas brasileiras, e a TV Aperipê nas rotinas produtivas da TV Brasil. Seguramente, foi esse trabalho que nos fez respeitados na EBC, a Empresa Brasil de Comunicação, com quem dialogamos no mesmo nível, com a convicção de que dialogamos no mesmo plano dos grandes canais do eixo sul-sudeste-Brasília, com quem tivemos, durante todo o tempo, uma interlocução respeitosa e de reconhecimento mútuo. Para não me alongar, vou apontar apenas o exemplo do programa Estação Periferia, o primeiro programa da televisão sergipana exibido em rede nacional (27 estados, mais de 100 canais) e rede internacional, pela TV Brasil Internacional, em 68 países. Levamos para o Brasil e o mundo não só os modos de vida, a cultura e a beleza sergipanas, mas sobretudo um modo sergipano de fazer televisão. Dissemos ao mundo: nós somos capazes de produzir nossas próprias gramáticas audiovisuais para disputar a atenção do grande público presente na convergência digital.
Quando aqui cheguei, essa jóia da cultura e do povo sergipanos, que é a Fundação Aperipê, era o patinho feio da administração estadual. Era um dos poucos espaços que nem mesmo os políticos reclamavam para seus quadros. Na posse, prometi apenas uma coisa ao governador Marcelo Déda: vou honrar o cargo e dignificar minha gestão. Eu sabia que daria certo, por duas razões bem simples: 1) me sentia capacitado para tal; 2) montaria uma equipe que iria fazer, comigo, a passagem da velha para a nova Fundação Aperipê, digital, cumprindo a finalidade nobre da educação, cultura e do jornalismo cidadão. Sempre conferi ao exercício desse cargo uma importância que só eu sei, uma importância me enchia de orgulho e alegria, mas não uma importância banalizada num ato pueril como bater no peito e achar as nomenclaturas e os cargos nos bastam. Não. A Aperipê era importante porque eu a sabia instrumento de mudanças objetivas, concretas, da construção e reforço da identidade sergipana, de nossa interlocução com o mundo global no mesmo patamar de quem também se sabe dono de uma cultura superior, a cultura sergipana; de quem elabora suas próprias sintaxes, ferramenta para a produção do conteúdo local, justamente a matéria prima da cultura imaterial com a qual ingressamos no extenso universo multicultural das disputas simbólicas.
Os desafios eram os de sempre – e tão batidos, que nem vou referi-los. Mas não vim para choramingar pelos escassos recursos, materiais ou humanos. Vimos para realizar na adversidade. E foi nesse ambiente de eterna crise que renegociamos dentro do próprio governo a restauração da credibilidade perdida. Eu e Mônica peregrinamos por todos os Crafis e equivalentes da administração estadual, prometendo, tão somente, cumprir as regras, prazos, enfim, exercer nossa atividade precípua com competência e dentro dos cânones do serviço público, sem atalhos, remendos, sem fazer de uma repartição pública uma ação entre amigos, sem permitir a perniciosa prática dos variados tipos de assédio, que, lamentavelmente, é tão comum no nosso país; sem nepotismos ou outras modalidades de benefícios aos nossos; sem perseguições ou injustiças. Ainda temos muito que avançar, não só na consolidação do PCCV, mas, mais que isso, na valorização e reconhecimento da comunicação pública, desde o ambiente interno, do governo, até as demais esferas, sem esquecer que essa finalidade só se cumpre com a valorização daqueles que materializam as metas e os discursos, os trabalhadores que operam o milagre de colocar no ar, diariamente, duas emissoras de rádio e uma televisão, máquinas que funcionam com lógicas de mercado, mas com engrenagens do serviço público.
Fizemos tudo isso, nos permitam a imodéstia, com competência, racionalidade e transparência, um padrão raro na atual conjuntura do serviço público brasileiro. Otimizando o uso de cada real disponível, fazendo reengenharias diárias para o melhor aproveitamento dos recursos humanos. Certos de que os recursos do tesouro estadual, que já não eram generosos com nossa Fundação, são cada dia mais escassos, apostamos nas parcerias locais para viabilizarmos o apoio cultural para algumas produções. Focamos prioritariamente na prestação de serviços à EBC, através do contrato do jornalismo, vendendo conteúdo local à rede. Foi daí, economizando cada centavo, como uma dona de casa rege a economia doméstica, que juntamos os recursos para fazer a passagem de patamar tecnológico, de analógico para digital.
Assim, ao concluir essa etapa muito rica no currículo dos que compõem nossa equipe, gostaria de agradecer a todos e, na impossibilidade de citá-los um a um, me permitam os demais, homenageá-los nas figuras de Mônica Passos, diretora administrativa e financeira, com quem sofri diariamente as dificuldades, mas em quem encontrei talento e disposição para enfrentá-las e vencê-las: minha grande e fiel colaboradora, que ajudou a fazer uma Aperipê grande. Jefferson Andrade, esse touro de quem se dizia indomável, mas com uma inteligência maior do que o propalado temperamento: um lutador incansável, uma das maiores referências das telecomunicações do nosso estado. A Rosângela Dória, uma guerreira fazendo no seu cotidiano o milagre da multiplicação dos parcos recursos, para registrar as ações de governo, atender à TV Brasil e, principalmente, servir à sociedade civil sergipana, com um jornalismo politizado, mas sem partidarizar sua atuação, nem se submeter ao corporativismo daninho, uma praga que está destruindo o estado brasileiro. Por fim, ao meu provedor musical Alex Santana, cúmplice na formatação de um conceito de rádio que fez da Aperipê FM uma das melhores do Brasil. Porque criar um canal de música, mesmo que bem selecionada e antenada com as novas emergências, não significa necessariamente fazer uma rádio arejada, que passeia sua programação pelos vários públicos ouvintes, sem desprezar o jornalismo cidadão e a prestação de serviços.
Quero agradecer ao meu amigo Belivaldo Chagas, novamente vice-governador, mas que, como secretário de Educação do exercício anterior, portanto presidente do Conselho Deliberativo da Fundação Aperipê, foi parceiro da dor e da alegria na saborosa aventura de conduzir esta casa. Belivaldo sabe muito bem das dificuldades e, como presidente do Conselho, contribuiu enormemente para as realizações da Fundação Aperipê. Por fim, quero desejar as boas vindas a um amigo de longas datas, um companheiro de trabalho em vários veículos por onde passamos, um profissional ético e competente, cuja escolha acertada é garantia de continuidade dos avanços e conquistas. Messias Carvalho estava afastado do rádio, quando fui buscá-lo para encarnar o nosso jornalismo cidadão nas rádios Apeipê. E quando ele mal se acomodara no microfone, joguei no seu colo um novo desafio: fazer o programa também na TV. De modo, meu querido Messias, que a passagem para seu comando é a mais suave e tranqüila possível, sob todos os aspectos. De parabéns você e o governo que o terá como auxiliar dos mais importantes.
Mas quero agradecer, fundamentalmente, ao governador Marcelo Déda, que me convidou para – citando novamente Alex Santana – o melhor emprego do mundo (porque quando a gente gosta do que faz, o trabalho parece brincadeira). Ao governador Jackson Barreto, que assumiu efetivamente em 2013 e me confiou a direção da Fundação até este momento, me dando a raríssima oportunidade de trabalhar pela comunicação e cultura de Sergipe. Tudo o que nossa geração de combatentes irrequietos queria era justamente isso: a chance de realizar. E os governadores Marcela Déda e Jackson Barreto, ao me nomearem, disseram: faça! Nós fizemos e os frutos ficam agora para o julgamento dos que se interessarem por história. Muito obrigado!