terça-feira, 10 de junho de 2014

Mais doses de Marcelo Mirisola, em “A volta do filho Morto”. A Santa Catarina, paraíso idílico dos mortais comuns, aparece assim para ele:



“Eu havia recém-chegado da estação Trianon-Masp e as barbies de Santa Catarina ainda me deslumbravam, a mania do ‘Paraíso’. O gado de corte deve achar aquilo lá, o pasto e o pôr-do-sol nas pradarias, ‘um paraíso’. É isso aí. Um lugar espremido entre o épico que é o Rio Grande do Sul e as esquisitices do Dalton Trevisan, em Curitiba. Vera Fischer é mulata do morro do Alemão. Um lugar que exporta barbies pros puteiros de luxo de São Paulo. Uma população bovina e trabalhadora e uns bobalhões tatuados. Surfistas, místicos franqueados pela Apae e estabelecidos com CGC, guia de recolhimento do Darf e IPTUs atrasados, granoleiros e caipiras em geral, gente branquela”.

“Múúúúúúú, gado. Um careca sinistro governador e a mulher dele, a fanhosa Chanel, prefeita da capital reeleita no primeiro turno. O Paraíso – só se for... – dos pilares de gesso ‘estilo Barbie boqueteando Julio César’ e dos neons triunfais nos solares do ‘Residencial Vovó Olga Favaretto’ e afins, paisagens de topetinho. O inferno (quer dizer, o paraíso) dos bailes de debutantes e dos colunistas sociais semi-analfabetos dos jornais de bairro, com direito ao ‘Danúbio Azul’ e muito laquê nas mães e as filhas cafungando pó, chupando pica e dando o rabo. Igualzinho ‘na televisão’. Uma coisa só. Qualquer lugar me servia em 1990. Onde o Judas perdeu as botas ou no inferno – agora sim, tamanha a carência e o desespero em que eu subia e descia as escadas rolantes da estação São Joaquim do metrô, em São Paulo. Do jeito que eu tava, seco e sem nunca ter fudido uma buceta de graça, qualquer lugar me faria feliz. O inferno, por que não este lugar?

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