domingo, 17 de julho de 2011

Uma nova cena em Sergipe


Ontem à noite fui ver “Cabaret dos insensatos”, peça com textos de Brecht e Jean Genet, direção de Lindenberg Monteiro, do prolífico grupo Stultifera Navis. Como passei cinco anos fora de Sergipe, acabei me afastando desta nova cena cultural sergipana que brotou em vários segmentos da arte. O Stultifera é uma dessas iniciativas que anima a crença numa produção cultural local rica e descolonizada. Minha chegada na Aperipê é uma oportunidade única de defender o conteúdo local, objeto de meu mestrado ao estudar o mercado de TV por assinatura em Aracaju. No futebol faço isso desde menino: sou dos poucos aqui que não tem um time fora de Sergipe.
Tenho uma leve queda pelo Santos, da cidade que abrigou muitos de meus conterrâneos macambirenses, mas, ao contrário do que diz o bloco carnavalesco, simpatia nem sempre é amor. Minha paixão pelas três cores da faixa do Tremendão da Serra, o glorioso Itabaiana, é – para além da emoçãoum ato de resistência à pasteurização do futebol via televisão, baseada num modelo de negócio que empacota a adesão dos jovens a algum dos clubes presentes na série “A” do Brasileirão. Neste modelo, nãolugar para o pequeno e o local. Isto acontece também com a cultura e não por acaso a televisão é a mesma via de introjeção de uma cultura global hegemônica e massacrante. O mesmo ocorre com as pequenas línguas nativas ameaçadas de desaparecerem – são três mil que correm o risco de sumir neste século.
A força bruta da publicidade fez com o futebol algo que pretendia com a política: com o patrocínio das TVs, o teatro das torcidas nos estádios perde força e, a essa altura, nem é mais a principal fonte financiadora do esporte. Os estádios, contra toda lógica, têm sua capacidade reduzida. Vejam o exemplo do Maracanã, que chegou a receber 200 mil torcedores, mas, quando fechou as portas, há dois anos, não cabiam mais que 80 mil. Com a política intentou-se o mesmo: transferir da praça para a telinha o vigor do debate público. A platéia das praças foi esvaziada.

Stultifera e o moderno teatro sergipano

O Sytultifera Navis não é a única novidade nesta nova cena sergipana. Conversando com o público de sábado, me informam que cerca de 500 bandas musicais sobrevivem no estado, percorrendo circuitos alternativos, divulgando pelas redes sociais. Mas o caso deste grupo teatral em particular é emblemático, pelo trabalho que Lindemberg vem tecendo desde que aportou aqui, alguns pares de anos, materializado na luminosa surpresa da Casa Rua da Cultura, experiência inspirada no projeto Rua da Cultura, no Mercado, estendida para um espaço amplo para oficinas de circo e teatro, além das próprias salas para a apresentação de peças.
Fiquei comovido com a presença de um público jovem e arejado, interessado em cultura, lotando as três apresentações de diferentes peças na noite do sábado. A Casa apresenta peças em temporadas, em vez das exibições avulsas, criando um circuito consistente, baseado na oferta constante e na consolidação do hábito. A direção de Lindemberg em “Cabaret...” é leve e segura, com uma brilhante geração de atores, que muito me lembrou um moderno teatro que assisti na Faculdade de Teatro da UFBa, quando o genial Walter Seixas Jr. brindava o público com suas montagens glauberianas, do próprio Glauber a Nelson Rodrigues. Isto foi nos profícuos anos 80 e eu achei que tinha se perdido nas minhas melhores memórias. Minha ida à Casa mostrou que não, com a vantagem de que esta cena está aqui, na nossa casa.
    

Um comentário:

lindemberg disse...

Ola, Luciano!
comentando de novo ja que o outro comentario parece que não entrou.
obrigado pelos comentarios e pela crença depositada no nosso projeto. aprendi com um dos meus mestres que futebol e teatro tem muitas coisas a compartilhar, no jogo, no drama e na emoção que contamina a platéia ou torcida.
O jogo do teatro sergipano ainda não esta ganho, mas temos craques de sobra para fazer nossa torcida vibrar.
grande abraço e sucesso na nova tarefa a frente da fundação aperipê!

lindemberg monteiro
diretor artistico da cia. de teatro stultifera navis