quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Borborigmas indiscretus


"Tanto faz" é um livro antológico, porque, se não inaugura, mas inscreve com talento o espírito beat na literatura brasileira contemporânea. Reinaldo Moraes, autor desta e de algumas outras grandes obras, incorporando Ricardo, protagonista e alter ego, conta o drama do personagem, estudante brasileiro fazendo mestrado em Paris, recebendo uma brasileira na sua kitnet, num momento intermediário entre a chegada da moça e a pretensão de levá-la à cama. Uma dor de barriga no meio do caminho:
- Abaixa as calças ao mesmo tempo que ouve o clek da vitrola ao fim do disco instaurando o silêncio na sala-quarto, a centímetros de onde ele está. Ouve até o pipocar esporádico das sementes de maconha no charo que Vera está puxando agora. Logo, os mínimos ruídos no banheiro também serão perfeitamente ouvidos por ela. É óbvio, ele pensa. Com a bunda devidamente ajustada na tampa de plástico do vaso, sente o tropel das Valquírias tripas abaixo, prenunciando explosões aerofágicas. Ricardo entra em pânico. Recorda o que leu numa certa Ars Amatória que achou num sebo da Rue Mouftard, escrita por um espanhol ocioso: o corpo do amante não tem fisiologia, diz o cara. Recomenda-se não jantar antes de um intercurso sexual para evitar “los muy desagradables y comprometedores borborigmas gastrointestinales”. Olé.

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