Está dito lá atrás que este blog começou há vários anos , mas depois acabou abandonado pelo seu chefe fundador . Voltei a blogar pelas razões já explicitadas, mas não custa repisá-las: o enfraquecimento do jornalismo como serviço público , em favor das lógicas do entretenimento e do negócio ; o declino da imprensa tradicional, que , por esta razão , diminui espaços , corta custos (empregados e salários nas primeiras levas ); a necessidade de intervenção nesta nova esfera pública midiatizada, no sentido de que , se não deixará de ser privada só pela ação de blogs independentes , contará, ao menos , com a presença indispensável do contraditório . Aqui estamos para isto .
Retomei o blog há seis meses, com o objetivo acima descrito, e também como fio de ligação com meu público e meu chão , não obstante estarmos num ambiente cada vez mais desterritorializado, o universo on line das redes infocomunicacionais. Meu “exílio ” acadêmico em Madrid, para um doutorado sanduíche na Universidad Carlos III, pedia compensações emocionais e de identidade . Ainda mais na difícil travessia que vivi neste período , culminada, por fim , com a perda do meu querido pai . A temporada de estudos longe dos últimos momentos de meu velhinho, o resgate dos compromissos desde os anos 80 estabelecidos com meus leitores da FOLHA DA PRAIA , a retomada de uma militância política que transfere o combate do partido para o jornalismo .
Do jornalismo que pratico há décadas (eu e um caminhão de gente no mundo inteiro ), o chamado new journalism fiz um diário de minhas experiências , ora mais particulares , ora universais mesmo . Aqui começo um roteiro de despedidas pela Espanha e fecho este capítulo para abrir outros , com a pretensão de inserir estas experiências no espaço comum em que tudo se discute, do particular ao universal , do público ao privado .
O Marrocos
Cheguei a Marrakech com uma hora de atraso , graças à pior companhia aérea do mundo , esta, sim , a campeã, Ryanair. É um pau-de-arara voador , com uns vinte meninos de colo chorando desde a sala do embarque em Barajas até o controle de passaporte nesta cidade linda e avermelhada. Fico com certa pena das aeromoças , obrigadas a circular pelo corredor vendendo bujingangas e perfumes , como fazem os bancos brasileiros , inclusive os estatais , que obrigam seus funcionários a atingirem metas ou cotas .
O Marrocos é lindo , envolvente, experiência radical , mas às vezes abusa de nossa paciência . Reza a tradição que toda compra deve ser negociada. Já sabia disso, mas sem idéia de como isso é estendido a tudo e como nos cansa. Minha estréia foi no táxi que me levou ao pequeno hostal situado nos limites da Medina, na parte de dentro , onde já se encontravam os colegas de Barcelona. Já sabia que o preço da corrida antecipadamente, mas fui obrigado a entrar numa absurda negociação para regatear o que , para mim , parece apenas o preço justo . Por fim , batemos o martelo : dez euros , por uma corrida de menos de cinco quilômetros , o que é caro , mesmo para os padrões europeus .
No hostal, sou recebido pelo sorridente Ali , que , além de não falar espanhol , arranha um inglês na velocidade 5, de modo que compreendo uma outra palavra . Ele oferece a bebida que , a partir de então , vai ser minha companhia de copo nesse país muçulmano : o chá de menta . É impressionante , porque , embora se consiga álcool em hotéis e restaurantes , no restante do país é impossível molhar o bico . Embora saiba da resposta , sempre pergunto por uma cerveja , um rabo de galo que seja, mas eles riem e dizem que “álcool não ”.
O segundo dia foi consumido nas vielas e no mercado de Marrakech, instalando uma tourada sempre que pretendia comprar um regalo para minha finada comunidade de namoradas, hoje reduzida à tietagem de irmãs e sobrinhas. Para não negar a fama de bicho-grilo , posta por amigos como Jorge Carvalho , no dia seguinte encarei um programa radical : eu e mais doze subimos as montanhas que circundam Marrakech, território berbere, e andamos o dia todo numa van até Zagora, uma cidade bonita e organizada nas franjas do Saara.
O deserto radical
Uma hora e meia e algumas piadas depois , chegamos num acampamento berbere, tribos nômades que habitam o Saara desde que Maomé vestia fraldas . Somos recebidos com uma rodada de.... chá de menta . Pergunto a Hassan, um dos simpaticíssimos rapazes condutores dos camelos e da infra toda , se não há um goró por perto , só para eu matar saudades da mardita. Ele aponta para o chá e tira uma chinfra: “uísque berbere”. Isso tudo na tenda principal , com todo o grupo sentado em tapetes e ao redor de duas mesinhas rebaixadas, onde depois foi servido o jantar , numa panelona para todos , frango cozido com legumes , pão e... mais chá . Um dos meus amigos fez cara feia e disse que não comia em prato coletivo , com todo mundo enfiando seu garfo . De minha parte , como é sabido , nada acho chato . Comi feito um sultão do deserto .
A segunda argentina, essa outra feiosinha, deu uns balanços e depois pediu: “Não sabe uma de Cássia Eller?”. Não . Rúmmm!
A agricultura sustentável
No Brasil, a palavra “sustentável ” cheira a Ong picareta , mas no deserto vi a sabedoria das tribos do Saara aplicada nos modos de cultivar a terra , de usar os recursos , irrigar , guardar água , enfim , viver com uma dignidade surpreendente .
O melhor suco do mundo
Um comentário:
Luciano, cá pra nós....a TAP é péssima, mesmo. E Portugal... sempre achei um paisinho meia boca... não gosto, definitivamete. Não seio que tanto as pessoas vêem nele. Já o Marrocos, está na minha lista!
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